quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Epílogo

São vinte e duas horas e trinta e dois minutos. Eu chego no aeroporto de Schippol, Amsterdã, preparado pra dormir mais uma noite. Dormir não, encostar na poltrona mais próxima, me enrolar no casaco e tomar conta da minha mochila. É minha viagem de volta da realização de um sonho de criança.
Eu me lembro como se fosse ontem. Meu pai me pegou pela mão, me levou pro aeroporto aqui de Juiz de Fora. Foi só um voo. Eu sobrevoei a cidade ( o que qualquer um que conheça sabe que não dura muito tempo). Mas eu lembro perfeitamente do meu pai olhando pra mim e dizendo: "Meu filho, que este seja o primeiro de muitas realizações dos seus sonhos."
E desde então, a minha vida foi se pautando em sonho a sonho. É isso que me mantém vivo quando eu estou achando que nada vai dar certo. É muito ideológico, muito distante, muita gente me diz. Mas pra mim faz todo o sentido, porque se eu morresse hoje, eu iria feliz de ter lutado por cada um dos meus objetivos.
- Sir, apparently you don't have a reservation. Report to the desk.
Sim, as quatro da matina da minha ida de volta, meu eticket acusa. Lá vou eu pro balcão, brigar de novo. Dura longos vinte minutos, mas eu sou muito bem encaixado no meio de dois senhores um tanto quanto corpulentos como eu. Bem ali, na rabeira do avião.
Aí lá vou eu, de novo de mãos dadas com meu pai, agora pro sítio. Ele olha pra cada uma das plantas e me ensina a plantar minha própria muda. Me explica cada uma das propriedades das plantas, como regar. Não a toa, isso me ensinou em todas as minhas viagens a trazer sementes que possam brotar no país. E, acreditem, eu realmente aprendi alguma coisa com isso. Não adianta regar lindões botões de flores, que não vão florescer num clima tropical se você não tiver o máximo cuidado na hora de escolher o que você quer levar. Nem sempre o que você quer é o que vai florescer no seu jardim, meu filho.
- Sir, apparently i don't have a seat.
Sim, eu não tenho um assento. Estou olhando para o número assinalado na minha passagem, e só está na minha frente uma armação de ferro sem lugar para colocar minha bunda.
- Ok, monsieur, just a minute!
Os brasileiros ao redor fazem piadas nos próximos vinte minutos, que atrasam também a decolagem do avião por causa do assento.
E lá estou eu pensando novamente na primeira vez que fui escolher meu futuro curso. Eu cheguei para os meus pais com a seguinte decisão:
- Eu quero filosofia, sociologia ou psicologia. Tem mais a ver comigo.
E mais uma vez, no momento em que eu parei de falar, meu pai retrucou:
- Tudo bem, meu filho. Não tenha medo de escolher sua profissão, desde que você garanta que vai ser feliz naquilo que faz e um cidadão de bem.
Eu fiz uma escolha diferente do que eu pensava, mas sempre contei com apoio total da minha família. E isso fez uma grande diferença pra mim: eu escolhi trilhar este caminho. Eu me sinto muito mais disposto hoje a lutar, porque a luta agora é minha, e é pro resto da vida!
- Eu preciso sair, não aguento voar.
Sim, a mulher do meu lado tem pânico de voar. Eu preciso levantar a cada dez min, o que inviabiliza qualquer tentativa de dormir. Agora já são mais de 30 horas sem sono decente. E estou tossindo como um cão, devido a diferença de temperatura e umidade do ar.
Minha cabeça se volta pra primeira vez em que fui a um jogo do vasco. Curiosamente, era a taça libertadores, a final. Eu estava mt doente, mas bati meu pé e resolvi ir. E lembro do meu pai, com aquele semblante de médico, do meu lado, tomando cerveja na cabeça encostado no alambrado. Preocupado, mas foi o primeiro a me por nos ombros quando o meu time venceu.
- O próximo onibus sai em dez minutos, na terceira plataforma a esquerda no corredor direito. Se guie pelas luzes de segurança.
Sim, a rodoviária está as escuras pelo apagão. E tenho dez minutos pra correr pelo tumulto para finalmente repousar em minha casa. O caos reina, os policias não sabem o que fazer, um turbilhão de pessoas não consegue comprar passagens pois o sistema está fora do ar.
Mas eu consegui finalmente chegar na minha casa. às duas da manhã, eu consigo pela primeira vez em 53 horas colocar minha cabeça no travesseiro e dormir. Mas impressionantemente, eu não consigo.
Só consigo pensar que realizei meu sonho de infância. E não era conhecer lugar nenhum. Não era viajar. Nem comprar mais uma planta. Nem desafiar minha saúde.
Minhas lembranças só remetem ao maior professor que eu tive na minha vida. E por isso eu criei minha própria head fake, já diria randy pausch. O tempo que eu gastei lembrando e escrevendo sobre isso não é pra mim. É sim uma homenagem. A viagem não é pra mim. Mas sim pra você, pai.
E lá se vão seis meses.

3 comentários:

  1. Parabéns por um blog tão único.
    Vc é um cara diferenciado!

    Grande abraço.

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  2. Leo, muito legal suas reflexoes sobre a viagem e os links que vc fez com sua vida. Parece que vc resumiu sua vida inteira nesse post!
    Tambem, pudera, vc fala dos seus sonhos!! E eles sao a essencia!
    Roberta Carminati

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  3. Posso dizer que esse foi um post que eu realmente gostei!
    Muito bom ler vc falando sobre seus sonhos...
    Espero que realize os muitos outros que vc tem!
    Vc é realmente um cara diferenciado[2]!
    Abraços!

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